O termo “produção de natureza” enfatiza a condição existente nas áreas bem protegidas e com alta biodiversidade de produzir insumos dos quais não podemos abrir mão como, por exemplo, a água.
Nossa percepção de desenvolvimento convencional está baseada em processos continuados de crescimento, no aumento da produção, na criação de empregos e no incentivo à criação de novos negócios. Uma agenda de toda a sociedade, em tese, com uma perspectiva comum de melhorar a qualidade de vida, gerar riquezas e prosperidade. Para perseguir esses objetivos usamos como matéria prima os insumos ao nosso redor – que estão à nossa disposição e são oferecidos pela natureza.
A evolução dos negócios permitiu o alcance de produção em escala cada vez maior, seja por meio de ações básicas de extrativismo, seja pela implantação de atividades voltadas à agricultura e pecuária ou no beneficiamento de produtos primários através da industrialização e na busca contínua por novas tecnologias. Tudo com a premissa de que precisamos crescer para resolver nossas demandas, em geral reprimidas, de aporte de uma condição mais favorável à população.
Devemos reconhecer que nossa arrogância e inconsequência permitem que não existam movimentos suficientes para que uma mudança de percepção passe a preponderar. Sem um entendimento mais adequado do papel das áreas naturais bem conservadas em meio a nossas expectativas de evolução como sociedade, continuaremos seguindo por um caminho que agrega riscos e prejuízos que não são parte de uma ficção gerada pelos verdes radicais.
Aparentemente os amplos insumos científicos que demonstram de forma categórica os efeitos convergentes da perda da biodiversidade e das mudanças climáticas não estão gerando o efeito necessário. Está claro que não basta haver conhecimento suficiente para identificar um problema, bem como saber como solucioná-lo, se a sociedade simplesmente se recusa a admitir essa necessidade. Uma resistência bastante bem articulada está presente em nosso meio para permitir a continuidade das ações mais relevantes em termos de impacto ao meio ambiente, basicamente por estarem vinculadas aos setores da economia tão influentes que já conseguem manobrar as gestões públicas e a opinião da sociedade, a partir de retóricas que seguem sendo preponderantes frente ao desafio de gerar mudanças.
Sair da esfera científica e do apelo convencional da “conservação pela conservação” tem sido uma das práticas positivas que tem a possibilidade de mudar a condição de insolvência na qual estamos posicionados no que se refere ao tema da perda de biodiversidade. Uma das maiores colaborações recentes nesse sentido foi a criação do termo “produção de natureza”, que enfatiza diretamente a condição existente nas áreas bem protegidas e com alta biodiversidade de produzir insumos dos quais não podemos abrir mão. Embora os serviços prestados pela natureza sejam inúmeros, a água é um destes produtos mais evidenciados, originados das áreas naturais bem conservadas, e, em parte, melhor entendidos pela sociedade atualmente. A proteção de mananciais está diretamente relacionada com a resiliência a eventos extremos proporcionados pelas mudanças climáticas, cada vez mais frequentes e severos. Nesse sentido, pode ser mais fácil argumentar a necessidade de investimentos econômicos para a efetiva proteção de áreas naturais que circundam as cidades.
Evitar as explanações mais complexas sobre como funciona a natureza e quais são seus agregados sociais e econômicos passa a ser uma demanda premente. Cabe a exploração de um cenário mais fluido de fácil entendimento, agregado ao abandono do generalismo de expressões como “sustentabilidade”, para uma agenda determinada em busca de modelos de “economia restaurativa”, que insere as áreas naturais bem conservadas no íntimo de nossas atividades econômicas – um pressuposto básico e fundamental para o desenvolvimento. Políticas públicas que estejam determinadas a gerar resultados em escala nesse campo só serão efetivadas se ocorrer uma pressão da sociedade como um todo nessa busca por mudanças que assimilem definitivamente a natureza em nossa pauta de prioridades máximas, mesmo que muito tardiamente.
Se conseguirmos mudar o modelo mental da sociedade, que ainda enxerga a natureza como um empecilho ou um elemento lúdico de baixa relevância, evidenciando esse ativo como um grande motor capaz de manter os insumos básicos que são necessários para a nossa qualidade de vida e continuidade de nossos negócios, possivelmente poderemos ter um maior envolvimento de todos numa mudança de cenário tão premente. A natureza – grandemente afetada pelas nossas mãos – é parte dos negócios e, portanto, necessita ser vista como um insumo fundamental e demandador de proteção e de investimentos suficientes para que continue produzindo.
FONTE: https://oeco.org.br/analises/a-importancia-de-uma-industria-chamada-natureza/